Será nesta quinta-feira, dia 18 de novembro, a partir das 18h30, a palestra minha e da Karina Lumena sobre auto-controle, autoliderança e finanças pessoais no INEPAD, em Ribeirão Preto.
Os lugares são limitados, e preferência é dada para quem trabalha no INEPAD. Mesmo assim, quem quiser tentar, ligue para 2111-0250, e fale com a Carla.
Um abraço em todos, e bom controle nesse final de ano!
Ana Kazan
terça-feira, 16 de novembro de 2010
terça-feira, 2 de novembro de 2010
O Julgador
Se, no intuito de se comunicar com os outros o sujeito busca sempre a justiça, e de forma equilibrada, trata a todos com igualdade esteja onde estiver, este se torna um Julgador.
Se, obtém a sensação de não agir com preconceito, privilégios ou favores especiais, e toma decisões que devam passar pelo crivo de sua lógica atendendo aos seus parâmetros de justiça, este se torna um Julgador.
O ato de julgar vai muito além de uma expressão pejorativa, algo que evitamos fazer, algo que evitamos tornar explícito. Parece contraditório, não?
O sentimento de tratar as pessoas com igualdade se mistura com o sentimento de estar julgando esta mesma pessoa a cada segundo. Afinal de contas, a igualdade estaria fundamentada em quê? E a justiça? Acredito que tudo isso seja obra de nossas mentes acostumadas, vividas, lapidadas e até mesmo maliciosas, porque não!? Acostumadas a tirar conclusões, por fim, julgar.
Nos tornamos amadurecidos e preparados julgando, nos tornamos espertos e eficazes julgando, nos tornamos sociáveis e populares julgando.
Demorei a aceitar, mas me dei conta que me tornei um Julgador, um grande Julgador, e eu mesmo procurei por isso.
Na verdade, pra livrar o meu lado, defendo a idéia de que o ato de julgar, aquele recriminado pela Igreja, e o ato de julgar que estou falando, calcado em conhecimentos e aprendizado anteriores, deveriam receber palavras diferentes. Deveria ser: julgamento irracional X julgamento racional. Afinal de contas, se o intuito é usar de justiça e falta de preconceito ao tratar as pessoas, não pode ser tão ruim, certo?
Mas mesmo assim, ainda me bate um sentimento de poder estar fazendo a coisa errada.
Com anos e anos de prática, não poderia deixar de analisar se minha própria caixa de ferramentas julgadora esta afinada. Acho que é porque no fundo, eu me sinta mal por exercer tão plenamente esse hábito, e tento chamar de racional.
Essa grande ferramenta me deu avidez, me deu uma visão apurada das pessoas, das coisas, do sistema econômico, do meio ambiente, e até mesmo de pequenas ações. E o perigo esta exatamente aí, no momento que nos achamos capazes e preparados para escolher o livro pela capa, passa a barreira do racional.
Nós julgadores, precisamos de constante manutenção, a cada 5000 julgamentos, recebendo injeções de humildade e autocrítica, para não cairmos na besteira de achar que as coisas estão todinhas mapeadas, como o nosso julgamento racional nos ensinou.
Daí a verdadeira virtude do julgador, saber controlar seus impulsos e, constantemente revalidar seus critérios, nunca subestimando seus erros, pois, o tempo passa, as pessoas amadurecem, as coisas evoluem, e se não ficarmos atentos o tempo todo, em algum momento estaremos deixando de ser um julgador racional para nos tornarmos um julgador irracional – prepotente - e, do ponto de vista de um Julgador reflexivo compulsivo, um grandessíssimo idiota. (rs, não me veio outra palavra à mente.)
Portanto, bom dia a todos e bons Julgamentos para o resto da semana!
sábado, 25 de setembro de 2010
Titica? Ah...Tiririca
Se não bastasse o programa de indicações que virou a propaganda eleitoral GRATUITA brasileira, ainda tenho que ouvir (e quase concordar) que a propaganda política está mais engraçada que muito programa humorístico por aí. No entanto, minha concordância fica no quase, porque se o que se apresenta lá são piadas, elas são de altíssimo mau gosto.
Cantores, jogadores, modelos (oi?) falidos tentam se eleger. Baseados em que? No serviço já prestado à sociedade? Queria mesmo saber o que a mulher-pêra contribuiu... na verdade, é melhor não saber. Agnaldo Timóteo, Kiko, Leandro, Marcelinho Carioca, Ronaldo Ésper, Mulher-pêra (que nem usa o nome verdadeiro, tamanha persona assumida) e... a lista é grande.
De todos os ilustres candidatos, o que mais sobressai, sem dúvida, é o Tiririca. E é sobre ele que eu quero falar.
A Folha de São Paulo publicou uma matéria a respeito de um gibi que o humorista está distribuindo em sua campanha. Nesse gibi ele emprega todos os jargões por ele usados em seus programas/shows, para - pasmem – tirar sarro de suas próprias propostas. Claro, o “propostas” ficou por minha conta porque na verdade ele não tem proposta nenhuma a não ser tentar descobrir o que um deputado faz.
Como não podia deixar de ser, tratando-se de quem é, as piadas são de péssimo gosto. Por exemplo, em uma das páginas do tal gibi (ah! Os gibis são distribuídos preferencialmente para as crianças, para que elas peçam para os pais votar no “abestado”) ele diz que não faz discriminação, e para exemplificar há o desenho dele chamando um rapaz, pressupostamente, gay de “menino bonito”. É uma lástima. Além de não apresentar nenhuma proposta, ele ainda ridiculariza os direitos sociais, com tanto esforço alcançados e ainda não adquiridos por completo, de idosos, gays e mulheres.
Votar no piadista não é nenhum protesto. Votar nele é dizer que qualquer um pode se candidatar, dizer que não pretende fazer nada, que não sabe quais são atribuições que o cargo ao qual ele pretende se eleger exerce, e que todas os direitos que a democracia zela para ele são ótimos motivos para piadas.
E ainda querem achar ruim o comentário que o Stallone fez?
Mas claro, não sou extremista o suficiente para não concordar com nada que o Tiririca fala, por exemplo, eu concordo muitíssimo com ele quando ele se afirma ser uma “abestado”. Opa, assino embaixo.
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domingo, 29 de agosto de 2010
Cidadania & Accountability
O conceito de cidadania é a noção radical de que ao mesmo tempo em que pertencemos a uma cultura, a uma sociedade, a um país, temos simultaneamente direitos e deveres para com ele. Temos o direito de sermos protegidos e termos nossa propriedade salvaguardada contra destruição natural ou daquela promovida por criminosos ou invasores; temos o direito de acesso a educação, saúde e sanidade, trabalho, dignidade, e a participar das decisões que incluem nosso destino nelas. Por causa desse último particularmente é que podemos votar, e até precisaríamos participar mais em plebiscitos, consultas dos políticos com relação às leis que nos governam. Numa verdadeira democracia, os cidadãos votam em todas as instâncias em que alguma ação pública pode impactar sua vida diária. Por exemplo, o governo pensa em fazer o embelezamento (plantio de flores e árvores, pintar meio-fio, etc.) de uma grande avenida. Acontece que em volta daquela mesma avenida, no bairro ali em volta, há outros problemas que precisam de resolução. Por exemplo: o bairro precisa de mais uma escola, ou, há muitas ruas esburacadas, ou, não há linha de ônibus conectando o bairro ao centro da cidade. Numa democracia, uma vez que os gastos são feitos com o dinheiro do povo (que contribuímos compulsoriamente através dos impostos), o povo é quem tem que decidir, através de votação, plebiscito, plenário, de alguma maneira, o que é que prefere que seja feito: o embelezamento da avenida, ou o conserto dos buracos, ou a linha de ônibus. Não há dinheiro para tudo, mas há prioridades. Quem as decide é o povo. Esses são os direitos dos cidadãos.
A cidadania, entretanto, implica também em deveres. Essa parte costuma ficar um pouco esquecida aqui no Brasil, e até dá prá entender um pouco a razão. Acostumados à situação de “terra de ninguém”/ “salve-se quem puder”/ “o importante é levar vantagem em tudo, certo?” que isso aqui virou na mão de tantos e tantos políticos desonestos, que se protegem e enriquecem com o dinheiro e a propriedade pública enquanto abandonam a população que os elegeu, realmente estamos sempre pedindo e reclamando de algo que “eles” não fizeram. O “eles” (indeterminado, mas significando os poderosos, os governantes, o governo) estão sempre a fazer algo errado (em benefício próprio) ou a não fazer algo que precisa ser feito (geralmente algo que seria em benefício do povo ou do País). Não conseguimos nem imaginar o que mais que pode ser exigido de nós, os cidadãos, que já enriquecemos tanto todos os políticos, e tivemos tão pouco em retorno.
Na verdade, não estamos fazendo nosso dever. Explico. O dever, as obrigações dos cidadãos numa democracia são muitas, e são todas muito relacionadas com participar de todo e qualquer processo ou ação que impacte na nossa vida e nas dos demais habitantes, por exemplo:
1. Votar
2. Ajudar aos mais pobres
3. Ensinar algo que a gente saiba a quem não sabe
4. Proteger as pessoas que precisam de ajuda, tipo, criancinhas perdidas ou abandonadas, pessoas velhas, doentes ou fragilizadas, aqueles que se machucam no meio da rua
5. Manter a propriedade pública viável a todos. Aqui se inclui não jogar lixo na rua (nem pela janela do carro), pegar a caca de seu cachorro, não obstruir o caminho dos demais passantes (pedestres ou carros), não rabiscar as paredes das casas dos outros ou de edifícios públicos
6. Dirigir de uma maneira que respeite o direito dos demais de compartilhar com você a via pública, o que inclui andar na velocidade permitida (não muito abaixo nem muito acima), sinalizar quando for mudar de faixa ou virar, usar as faixas adequadamente (esquerda para ultrapassagem, direita para marcha mais lenta); não estacionar onde não é permitido; não dirigir alcoolizado ou sob influência de drogas para não arriscar a vida dos outros cidadãos, manter seu carro de maneira a não soltar muita fumaça que polua o pulmão das outras pessoas ou mesmo impeça a visão dos outros; não parar o carro no meio da rua para conversar com os amigos impedindo o fluxo do tráfego; etc.
7. Não gastar recursos que são de todos (tipo, esbanjar água lavando calçada, puxar eletricidade ilegalmente)
8. Inclui enfim qualquer ato ou omissão que prejudique ou atrapalhe os direitos das outras pessoas. Aquela frase sábia: “a liberdade de cada um termina onde começa a liberdade do outro”, é um jeito simples e ao mesmo tempo profundo de exemplificar cidadania.
De qualquer maneira que se olhe, cidadania implica accountability. Accountability é uma palavra da língua inglesa, que não tem tradução exata em Português, mas que significa a obrigação de prestar contas, de ser responsável pelo que nos comprometemos ou dizemos que vamos fazer. A Wikipedia menciona “responsabilização” como um possível significado, e sugere que accountability é uma palavra que se refere a um conceito ético ligado à responsabilidade social (que todos nós temos), incluindo a obrigação de informar e explicar aquilo que fazemos na interface pública. Vou sugerir que accountability possa se aproximar de fato do significado de “responsabilidade”. Ser “accountable” então é ser responsável pelos seus atos, responder por eles.
Parece grande, não é? Parece uma tarefa imensa, muito trabalho, ser cidadão. Permitam-me sugerir um lugar para começarmos: vamos evitar largar carrinhos de compras em estacionamentos, no meio dos carros (e atrapalhando-os). Que tal se procurarmos levá-los até um canto, onde não atrapalhem a manobra de ninguém, o entrar e sair dos carros e o movimento deles nos estacionamentos da vida. Não largá-los bem na frente (ou atrás) de um outro carro. Não ligar o “dane-se” que alguém não vai conseguir manobrar com nosso carrinho bem na frente. Não. Refiro-me a ser “accountable” pelo nosso gesto completo. Ser cidadão. Pelo menos nisso. Mesmo que isso implique em andar mais um pouco. É pouco, é quase que pueril, mas pode ser uma semente de cidadania que estamos plantando. É um jeito de pensarmos como uma comunidade, como um grupo de cidadãos compartilhando espaço, direitos e deveres uns com os outros. É um pequeno passo....mas pode ser o primeiro de muitos e maiores.
terça-feira, 24 de agosto de 2010
Ménage à trois
Algumas temáticas sempre foram problemáticas, algumas mais que as outras, é verdade, mas sempre foram. Exemplo disso é tema libido, desejo, vontade, querer o que todos querem e poucos assumem, enfim: a sexualidade.
Atualmente a coisa tem ficado mais escancarada, tenho certeza que alguém já viria me dar como exemplo o funk, mas acontece que eu não considero que virar a mulher pêra, melancia, framboesa, jaca ou carambola demonstre o avanço da mulher em algum aspecto. Diria que até pelo contrário. Assumir que temos desejo e que sim, faríamos várias coisas que as nossas avós desmaiariam se soubesse é verdade. Mas nem por isso temos que andar nuas ou com uma placa: “estou para o que der e vier” e, sobretudo a parte do ‘der’. Assumir a própria sexualidade não quer dizer, de forma alguma, que temos que esfregar nossas peripécias, ou a falta delas, na cara dos outros - digo isso de modo figurado, aliás.
Lembro-me de certa vez que estávamos em um churrasco com pais, mães, cunhados e cunhadas, crianças e amigos (que eram apenas amigos de alguns e não de todos, ou seja, para algumas pessoas elas estavam no meio de estranhos) e uma das cunhadas começou a dizer – em alto e bom tom – o que ela fazia e fazia (porque não teve quase nada que ela não tivesse feito ou não estivesse disposta a fazer, pelo menos).
O marido da dita pedia para que ela, ao menos, falasse baixo, tinha crianças por perto (filhas de pais evangélicos, por sinal) e que ninguém era obrigado a saber a vida dela. A rainha do sexo respondia que a criança tinha que saber, cedo ou tarde elas, as crianças, iam fazer o mesmo. Todos sorriam sorrisos amarelos e fingiam que estava tudo bem, afinal não seria eles a dizer: “esse assunto não é para este momento”. Imagina? Passar por conservador, retrógrado ou frustrado sexual? De jeito algum. O fato é que se confunde liberdade com libertinagem e as pessoas não sabem o que é adequação, confundem adequação (ou educação) com hipocrisia.
Será? Não acho que você não gritar tudo o que você faz, seja hipocrisia. Em linguística é muito claro o conceito de adequação. Por exemplo, se você estiver em uma entrevista de emprego você fala de um jeito, com uma criança de outro e com seu namorado ou namorada, de outro ainda. O que quero dizer? Simplesmente que você não pode falar para seu supervisor: meu tchutchutchu, como você está fofinho hoje com esse terniiiinho.
Óbvio, não é? Mas as pessoas acham que o que elas fazem entre quatro paredes pode vir ao conhecimento de todos e que quem estiver incomodado que se mude. Não saber o que você faz não muda, você anunciando ou não, já o constrangimento e a possibilidade de as pessoas conversarem sobre o tema (para que muitos preconceitos sejam desfeitos, inclusive) modifica por causa da vulgaridade de alguns.
Para mim, certos tipos de exibição são feitas para reafirmar o indivíduo, a pessoa sente necessidade de 'dizer' o 'quanto ela é boa'. A partir do momento que a pessoa precisa convencer sobre o próprio valor, já há algo errado, ou não?
domingo, 22 de agosto de 2010
Onde estão os bons?
Impossível não continuar falando de política nessa fase. Desculpem a overdose. Falta pouco para as eleições, e esse é o momento para quem sabe, através de saturar os sentidos, regurgitar serenas decisões para o momento da urna.
Que momento esse, não? Que nome pôr? Quem se salva? Lembro-me de uma eleição – em 1986, uma das primeiras abertas no final da ditadura - quando Antônio Ermírio de Morais foi candidato ao governo do Estado de São Paulo. Eu sempre confiei nele. Achava-o um desses baluartes brasileiros de integridade e eficiência, alguém que tem muito a – e pode - contribuir para trazer o país ao desenvolvimento que ainda acho ser sua vocação. Mesmo considerando o fato dele ser um empresário, o que sem dúvida o coloca dentro do grupo que precisa fazer e aceitar algumas iniqüidades para sobreviver, ainda assim suas declarações foram sempre brutalmente honestas, do tipo “doa a quem doer”, sérias, responsáveis, cívicas (essa é a palavra!) de alguém que não precisava agradar ninguém. E mesmo assim – sem precisar agradar ninguém - suas indústrias progrediam e ele multiplicava empregos aos seus concidadãos. Em entrevistas daquela época, o Ermírio não se esquivava de compartilhar a bandalheira que era o jogo político. Para minha tristeza ele perdeu aquelas eleições para Orestes Quércia, e São Paulo perdeu o governador que merecia.
Tem sido assim, uma sequência de decepções a história política brasileira com raríssimas exceções. Fiquei muito orgulhosa, por exemplo, quando Fernando Henrique Cardoso foi eleito presidente do Brasil. Estava fora do país nessa época, e vivia na pele o preconceito contra nossa cultura populista, relaxada, a cultura da bebidinha, da prainha, do sambinha, das mulheres eternamente seminuas retratadas nas praias brasileiras, a cultura dos brasileiros sempre atrasados, sempre dando e pedindo “um jeitinho”, a nossa política sempre pendendo, saindo de, ou quase entrando numa ditadura... De repente temos um professor doutor na presidência, alguém que causou ótima impressão no Exterior, e elevou a confiança dos estrangeiros no Brasil. O homem que plantou todas as sementes e os programas que o analfabeto atual se apropriou desavergonhadamente, enquanto carrega o Brasil para a humilhação pública internacional ao se aproximar de ditadores, assassinos travestidos em governantes (Hugo Chavez, Fidel Castro, e Ahmadinejad, entre outros).
Agora de volta ao Brasil, preparando-me para votar após quinze anos de ausência, pergunto-me onde estão aqueles conterrâneos que elegeram Fernando Henrique? Deve ter tido alguém com bom senso então. Claro que então havia um candidato, ao contrário de agora quando, tirando do páreo desde já a pilantra da Dilma, dá medo de que o Serra possa estar imerso além da salvação no jogo das fantasias e comprometimentos políticos, a Marina tadinha, pouco pode prometer ou fazer com seu discurso verde comprometido com uma religião de grande tendência manipuladora, enquanto o Plínio vem com aquele discurso amalucado comunista...não sobra ninguém.
Pois aqui vai uma sugestão: e se todos nós, com bom senso no coração, votássemos no Fernando Henrique? Que importa ele não ser candidato? Talvez se todos votarmos nele mostraremos que ainda existem mentes críticas e independentes no Brasil, ainda existem aqueles que acreditam na decência, na educação, no preparo, na visão de fundo, naquele que foi o melhor presidente que tivemos até agora. Mostraremos que não somos bobos, manipuláveis marionetes, que não temos que nos conformar com cafagestagem. Não estou dizendo que o Fernando Henrique foi perfeito. Mas chegou perto.
Pronto. Taí! Está lançada a candidatura popular do Fernando Henrique Cardoso. Meu voto é seu, professor!
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sábado, 21 de agosto de 2010
Eu e a política
(Post nascido de um diálogo com a Dai sobre esse blog)
O que mata nos militantes políticos em geral é a falta de sobriedade:
Vê-se em dúzias de blogs por aí aquele tom deslumbrado, ufanista, chato, pior que os romances mela-cueca de novela mexicana: o militante trata o político "bola da vez" como se fosse um semi-deus, seus marqueteiros como arcanjos, e por aí vai.
Eu não assisti a propaganda eleitoral. Pode parecer coisa de gente elitista e de mente pequena, mas sinceramente, horário eleitoral, via de regra, é coisa pra fazer a cabeça de semi-analfabeto. É para quem não lê os jornais todos os dias ao longo de anos, nem acompanha o desenrolar político do país entre os meses de outubro dos anos pares, visando inclusive consolidar uma opinião de verdade sobre quem governa ou não essa terra de bananas.
Eu imagino o tom de "apelação" adotado pela maioria absoluta dos candidatos. Ou é a tradicional previsibilidade da época, ou sou eu adquirindo poderes especiais para adivinhar o que acontece dentro da caixinha preta que me recuso a ligar para outra coisa que não ver meus filmes ou jogar video game. Além do mais, minha antipatia pelo partido de situação é pública e notória.
Minha bronca com o PT é pela cara lavada. Como disse Jabor no texto "Os Grandes Arrepios": Lula se apropriou dos feitos de FHC. Numa espécie de mitomania esquizofrênica, e no melhor estilo de Joseph Goebbels, Lula repetiu sua versão mentirosa e maquiada dos fatos por sete anos, até que o povão a visse como verdade.
Nesse caso, não diferente de tantos outros nos quais os Maluf's da vida se elegem e reelegem (tendo ainda a capacidade de vir a público dizer "não há ficha no Brasil mais limpa que a minha"), conta-se muito com a memória curta do brasileiro - que mandou em 2006 ao Senado Federal o mesmo Fernando Collor de Mello que foi enxotado da Presidência da República em 1992; que elege famílias inteiras de Sarneys, Rorizes e Magalhães, ou quando não elege, mantém-se passivo quando um desses usurpa o poder (como fez a Governadora Roseane recentemente).
Se não se lembram de quem é Fernando Collor, não me admira que também não se lembrem do outro Fernando. O que me causa estranheza é justamente a rejeição ao Fernando errado.
Se houvesse essa atenção à história, como o senhor do biscoito fino (huhu) andou declarando, certamente o presente seria diferente. Não me oponho à luta armada contra a ditadura, são os métodos apenas que me deixam apreensiva. Creio que é possível o uso da força, em alguns casos, até mesmo necessário. O que reprovo é a falta de discernimento. O mesmo discernimento que faltou aos católicos na lamentável "Marcha da Família com Deus para a Liberdade", faltou aos socialistas radicais em toda a sua existência.
Do longo trajeto da militância à rampa do Palácio do Planalto, não foi só a sobriedade etílica que faltou ao Lula e seus caporegimes. Faltou a sobriedade ética. Faltou ser razoável. O pensamento de que o Presidente da República pode fazer e dizer tudo o que quiser deveria ter morrido junto do regime militar, por se tratar de um conceito de insensatez gigantesca, e característico de um raciocínio ditatorial. Infelizmente, não é o único ponto no qual Luiz Inácio se aproxima daquilo que dizia combater.
A história mostra que a esquerda hoje sentada na cadeira mais alta de Brasília não é muito diferente da esquerda de Pyongyang ou Havana, nas cadeiras mais altas de países tão "república" no nome quanto o Brasil. Aqui havia a oposição ao governo militar, mas diante da oportunidade de uma transição para a democracia, deixaram de apoiar a única possibilidade de libertação porque o candidato não seria o deles.
O tempo mostra que a oposição ferrenha a Sarney, Collor, Calheiros, e tantos outros, se deu apenas porque os "picaretas com anél de doutor" não reservaram ao metalúrgico uma cadeira também. Com uma pequena bola de cristal, todos os poderosos de décadas atrás teriam dissolvido a esquerda brasileira oferecendo a Lula, José (que também virou Zé) Dirceu, Palocci, e tantos outros, algumas cadeiras em estatais, na câmara e no senado, e lhes antecipando o mensalão.
Vivemos em um país patético, que faz juz a todos os ditados que cria: "Todo político rouba", "Quem nunca comeu melado quando come se lambuza", "Todo mundo tem um preço", "O poder corrompe o homem", e assim por diante.
É lamentável.
Quando me deparo com esses fanáticos petistas, que são tão cegos e irredutíveis quanto os evangélicos neo-pentecostais e os defensores de linux, eu perco a fé na humanidade.
São todos casos perdidos, e só resta aos mais razoáveis lamentar pelos errantes serem numerosos o suficiente para manter nosso reino de enganados na lama da corrupção e ignorância.
Enquanto isso o "país do futuro", como sempre, vai ficando pra amanhã.
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Por Reticente
domingo, 15 de agosto de 2010
Ideologia: escolha uma prá viver
Em 1988 Cazuza gritava - e o Brasil junto com ele - querer uma ideologia prá viver. Cansados de ditadura, de segredos, de desmandos, de desconfianças, queríamos confiar e seguir, puramente, uma ideologia, pois estávamos sem nenhuma. A Redentora, como a revolução de 1964 se auto-proclamou em sua proverbial arrancada, não nos forneceu uma, que muitos de nós queríamos e até precisávamos. Vínhamos afinal de um período de muita corrupção, abuso do dinheiro público, falta de confiança nos governantes (alguma similaridade com o que vivemos agora?). Olhar os jornais da época imediatamente antes do fatídico março de 1964 é como olhar os jornais de hoje. Recomendo a pesquisa para quem quiser se aprofundar.
Aliás, essa seria uma boa pesquisa para limpar um pouco o nosso passado tantas vezes tão desinformado. Não estou defendendo que ditadura é bom. Mas estávamos demais sem rumo, sendo abusados (da mesma maneira como estamos sendo abusados agora) por políticos demais de corruptos. A única diferença com agora é que as forças armadas eram mais fortes e resolveram tomar a si a tarefa de moralizar o país. Era esse o intuito - pelo menos o divulgado - no início da Revolução. Que atire a primeira pedra quem nunca pensou se não haveria um poder maior para acabar com essa baderna política, moral, ética (e que mais?) generalizada que está o Brasil! Naquele ano de 1964, esse poder maior foi o militar. O problema, infelizmente, é que o poder seduz demais, e depois nem eles querem mais sair, nem continuam tão santinhos. E o povo volta a ser - continua sendo - abusado!
Tudo isso para abrir o assunto da ideologia. A que quero falar é aquela que vem disfarçada em boas - ótimas! - idéias, soluções das quais precisamos e as quais abraçamos com entusiasmo e (tantas vezes) com ingenuidade, apenas para depois percebermos que atrás delas tinha uma ideologia da qual não havíamos sido informados. Todo um grupo de pessoas com suas bíblias/seus códigos, reunindo-se em cúpula sem os cordeirinhos seguidores, decidindo os rumos do grupo entre eles, e fingindo que a gente faz parte das decisões.
Será que o distinto(a) e generoso(a) leitor(a) desse blog já se viu em uma situação dessas, em que é convidado para algo que parece ótimo, e ao chegar, com o passar da conversa ou do tempo, percebe que há ou uma igreja por trás de tudo, ou um grupo filosófico, ou um partido político, ou uma seita, enfim, algo que não aparecia do lado de fora....?? É a essa que me refiro.
Pois não nos enganemos: esses golpes são tão ruins quanto a ditadura foi, senão piores, porque a ditadura pelo menos a gente sabia que era o que era. Afinal, os movimentos, políticos, grupos, seitas e religiões que se escondem atrás de máscaras santimônias estão nos enganando, estão querendo mostrar um poder de multidão que na verdade não têm, e usando de nossa boa fé para isso. Sendo o brasileiro um povo dócil e que não gosta de confrontar, muitas vezes acabamos lá, como ovelhas no abate, adicionando número e emprestando ouvidos a discursos que não queremos ouvir, tentando nos adaptar a ideologias das quais não gostamos, sendo mentalmente e emocionalmente estuprados, desviados daquilo que realmente gostaríamos de estar fazendo - o que quer seja aquilo que queremos.
Ser livre não é isso, ser bom não é isso, e ser gentil não é isso. Sem aprofundamento filosófico, e numa definição bem geral, ser livre é poder ser o que se é abertamente, sem nenhuma censura (seja de olhares virados, brincadeiras, cutucações, ironias, ou cochichos), ser bom é agir com ética e fazer sempre o melhor que pudermos, e ser gentil é respeitar o outro e a nós mesmos mantendo a dignidade e a integridade de todos.
Estou mencionando isso porque acabei de viver (de novo) tal aventura - em plenos 2010 e após algumas décadas de vida - o que me diz que os oportunistas da captação cerebral não descansam - nem cansam - nunca!
Então vamos prestar atenção, pessoal da tribo das pessoas boas, e não vamos esquecer que, especialmente nesse ano político, e se é verdade que somos agora livres, podemos respeitosamente levantar e sair dessas armadilhas e nos dedicarmos a sermos nós mesmos.
Aliás, essa seria uma boa pesquisa para limpar um pouco o nosso passado tantas vezes tão desinformado. Não estou defendendo que ditadura é bom. Mas estávamos demais sem rumo, sendo abusados (da mesma maneira como estamos sendo abusados agora) por políticos demais de corruptos. A única diferença com agora é que as forças armadas eram mais fortes e resolveram tomar a si a tarefa de moralizar o país. Era esse o intuito - pelo menos o divulgado - no início da Revolução. Que atire a primeira pedra quem nunca pensou se não haveria um poder maior para acabar com essa baderna política, moral, ética (e que mais?) generalizada que está o Brasil! Naquele ano de 1964, esse poder maior foi o militar. O problema, infelizmente, é que o poder seduz demais, e depois nem eles querem mais sair, nem continuam tão santinhos. E o povo volta a ser - continua sendo - abusado!
Tudo isso para abrir o assunto da ideologia. A que quero falar é aquela que vem disfarçada em boas - ótimas! - idéias, soluções das quais precisamos e as quais abraçamos com entusiasmo e (tantas vezes) com ingenuidade, apenas para depois percebermos que atrás delas tinha uma ideologia da qual não havíamos sido informados. Todo um grupo de pessoas com suas bíblias/seus códigos, reunindo-se em cúpula sem os cordeirinhos seguidores, decidindo os rumos do grupo entre eles, e fingindo que a gente faz parte das decisões.
Será que o distinto(a) e generoso(a) leitor(a) desse blog já se viu em uma situação dessas, em que é convidado para algo que parece ótimo, e ao chegar, com o passar da conversa ou do tempo, percebe que há ou uma igreja por trás de tudo, ou um grupo filosófico, ou um partido político, ou uma seita, enfim, algo que não aparecia do lado de fora....?? É a essa que me refiro.
Pois não nos enganemos: esses golpes são tão ruins quanto a ditadura foi, senão piores, porque a ditadura pelo menos a gente sabia que era o que era. Afinal, os movimentos, políticos, grupos, seitas e religiões que se escondem atrás de máscaras santimônias estão nos enganando, estão querendo mostrar um poder de multidão que na verdade não têm, e usando de nossa boa fé para isso. Sendo o brasileiro um povo dócil e que não gosta de confrontar, muitas vezes acabamos lá, como ovelhas no abate, adicionando número e emprestando ouvidos a discursos que não queremos ouvir, tentando nos adaptar a ideologias das quais não gostamos, sendo mentalmente e emocionalmente estuprados, desviados daquilo que realmente gostaríamos de estar fazendo - o que quer seja aquilo que queremos.
Ser livre não é isso, ser bom não é isso, e ser gentil não é isso. Sem aprofundamento filosófico, e numa definição bem geral, ser livre é poder ser o que se é abertamente, sem nenhuma censura (seja de olhares virados, brincadeiras, cutucações, ironias, ou cochichos), ser bom é agir com ética e fazer sempre o melhor que pudermos, e ser gentil é respeitar o outro e a nós mesmos mantendo a dignidade e a integridade de todos.
Estou mencionando isso porque acabei de viver (de novo) tal aventura - em plenos 2010 e após algumas décadas de vida - o que me diz que os oportunistas da captação cerebral não descansam - nem cansam - nunca!
Então vamos prestar atenção, pessoal da tribo das pessoas boas, e não vamos esquecer que, especialmente nesse ano político, e se é verdade que somos agora livres, podemos respeitosamente levantar e sair dessas armadilhas e nos dedicarmos a sermos nós mesmos.
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
Salvem o planeta (aham, tá bom.. o planeta)
A frase com o apelo é antiga.
A presença de Marina Silva na campanha eleitoral traz um sutil holofote para o assunto. Ainda assim, a candidata do famigerado "desenvolvimento sustentável", e da preservação ambiental parece padecer de um mal: a indiferença de toda a população para esse tipo de questão. Al Gore, outro político, derrotado nas eleições presidenciais norte-americanas em 2000, é responsável pelo excelente documentário "Uma Verdade Inconveniente", no qual fala da urgência de trazer as questões ambientais para o centro das atenções.
Ao escolher o título de seu documentário, Al Gore foi preciso: de fato, é uma verdade inconveniente, que a grande maioria ainda insiste em ignorar, e alguns fazem de conta que agem, quando na verdade fazem coisas mínimas, para alívio de consciência e nada mais.
Me lembro de um pequeno adesivo pregado em minha antiga monark ranger: "chega de meio ambiente. lute por um inteiro". Também recordo do "Clube Ecológico" que a escola montou quando eu ainda era criança. A árvore símbolo era um jequitibá, árvore da mata atlântica, não do cerrado. Depois perceberam o erro, e mudaram para jatobá. O clube vendia camisetas para os alunos, ensinava a não jogar lixo na rua e fazer coleta seletiva de lixo. Um bom começo, claro. Outro dia recebi um e-mail, já faz algum tempo. Falando da tal "Hora do Planeta", quando todos devem desligar as luzes para mostrar que ligam para a Terra.
À época eu escrevi um post sobre o assunto: qualquer um é capaz de apagar uma luz. Entretanto, poucos se dispõe a realizar ações efetivas em prol da preservação, por um simples motivo: é desconfortável deixar o carro em casa para andar de ônibus ou metrô; é difícil prestar atenção todas as vezes que usa copos descartáveis, ou guardar o copo pra 15 minutos mais tarde quando for tomar mais café; escrever no verso da folha de papel às vezes é ruim; e assim segue. É relativamente simples entender o descaso: as mudanças são para salvar o planeta. É o que se diz, via de regra.
Todavia, a questão é outra, completamente diferente: o planeta está ótimo. Para a Terra, a única coisa capaz de destruir sua pacata vida seria o fim do Sol. Afinal, a "vida" de um planeta normal é orbitar ao redor de sua estrela, e isso a Terra continua fazendo muito bem.
Stephen Hawking recentemente declarou que as perspectivas de sobrevivência da raça humana nos próximos 100 anos é mínima. Ao explicar sua opinião, que chocou a muitos, ele foi bastante claro: esse planetinha não comporta tanta gente, os recursos são finitos e mal utilizados, nós mudamos nosso meio constantemente, e crescemos de maneira assustadora.
Aí verifica-se o verdadeiro ponto que sensibilizaria as pessoas: não estamos falando de salvar rãs, jacarés ou baleias. Não se trata somente do hábito condenável de caçar baleias por questões culturais no Japão, de arrancar barbatanas de pobres tubarões inocentes nas Américas, ou da extração de marfim na África. Nem se trata do planeta. É outro animal, que vai inevitavelmente seguir a fila da extinção.
A Terra, meus caros, estava aqui muito antes, e permanecerá (salvo em caso de guerras nucleares), exatamente como sempre. Quem caminha sobre ela, é irrelevante. A vida, de uma ou outra forma, encontra meios de sobreviver. Seja através das superbactérias que nós, os prepotentes, não conseguimos matar, ou das baratas. Talvez, no futuro, os humanóides descendentes de baratas sejam mais inteligentes que nós.
O que a grande maioria não percebeu é que descemos das árvores, entramos e saímos das cavernas, e nos tornamos um eficiente parasita.... de nós mesmos.
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domingo, 8 de agosto de 2010
De Tragédias e Banalidades
A violência e a rapidez que arrebataram do nosso mundo o filho da querida atriz Cissa Guimarães há pouco mais de uma semana ressonaram fundo no coração de todos os que a conheciam, seja como atriz ou – imagino ainda mais – como família ou amiga. Apenas o pensamento sobre o que ela deve estar passando dói em nós, física e emocionalmente. Qualquer imagem na mídia relembra, aumenta e aprofunda nossa dor, assim nos irmanando a todos com ela, como pais, mães, amigos, e com todos os pais, mães e amigos que jamais perderam filhos ou entes amados.
Ontem a TV já anunciava que ela está de volta ao palco encenando sua peça.
Tenho muito medo de banalizarmos tudo, muito, muitas vezes. Somos chamados a reagir rápido a tudo, a fazer decisões importantes sem tempo de pensar direito, “compre agora porque este é o último item”; acabou o relacionamento?; “não chore, parta para outra porque a vida é curta”, os amigos nos encorajam. Sem dúvida bem intencionados, os que estão à nossa volta nos aconselham a reagir rápido, talvez até temendo também nos perder por conta da depressão que acompanha as perdas, por conta de nos afastarmos de tudo aquilo que nos lembra aquele(a) ou aquilo que se foi. E repetem “a vida é curta”.
Não sei se concordo com essa idéia de que a vida é curta. Como brasileiros somos um povo muito espiritualizados, e acreditamos na permanência no mínimo da alma, alguns do espírito que na verdade somos, após o corte com os vínculos da vida física. Quer dizer, permanecemos, numa longa vida espiritual além dessa vida terrena, para aprendermos o que precisarmos aprender, ajudar no que pudermos ajudar, crescer no que formos chamados a crescer, para nos aproximarmos, algum dia, daqui a algum tempo, da perfeição divina que precisamos buscar. Então não sei se podemos dizer que a vida é curta. Quantas vezes temos muito tempo, e um tempo que fica bastante longo, quando nos arrependemos de algo que fizemos; ou temos que sofrer dores que não esperávamos; ou perdemos um ente amado para a morte ou para outrem. Não são tempos curtos, não. A vida, definitivamente, não é curta.
Outros bem intencionados nos dizem: “ninguém é insubstituível”. Será mesmo? Todos temos peças de reposição? Aquele sorriso único, aquele humor temperado por experiências juntos, aquelas frases (que dita em outros lábios não soam da mesma maneira), a risada, o entusiasmo ou a falta dele, o jeito de olhar, a garra, e até mesmo a preguiça simpática daqueles que amamos.... tudo isso é substituível? Difícil concordar. Não, as pessoas não são substituíveis, o que não significa que não possamos esquecê-las quando preciso, ou colocar sua memória naquele lugar administrável do nosso cérebro, onde as lembranças não nos machuquem tanto mais.
Mesmo em mais mundanas esferas: a roupa rasgou, aposentamos; o sapato estragou?, deixamos de lado; o aparelho quebrou?, compramos outro. Muda a moda e nós mudamos junto, banais, temporários, esquecíveis.
Talvez possamos evoluir sem precisarmos deixar de ser relevantes, cuidadosos, atenciosos com nossos sentimentos e com os dos outros. Ser moderno, ou ser contemporâneo, não significa ser indolor, nem pisar nos nossos corações quando machucadinhos. Faz parte de nossa humanidade o pensar, considerar, aprender com o que ou quem passou; dar um tempo para reflexão, para resolver e acatar a dor; para superá-la. Não precisamos sair correndo loucamente atrás de uma vida curta para esquecer pessoas substituíveis. Talvez, vale considerar, essas experiências doídas nos ajudem a crescer, se conseguirmos, se tivermos tempo de achar a lição nela. Podemos perder algo ou alguém, mas vamos tentar não perder a lição ou a cabeça.
Sabendo que a vida é longa, e seus acontecimentos não são banais, deposito aqui todo o meu respeito pela dor de quantos experimentam perdas tão dramáticas quanto Cissa, e todo o meu respeito pela maneira com que cada um vive sua dor.
Ontem a TV já anunciava que ela está de volta ao palco encenando sua peça.
Tenho muito medo de banalizarmos tudo, muito, muitas vezes. Somos chamados a reagir rápido a tudo, a fazer decisões importantes sem tempo de pensar direito, “compre agora porque este é o último item”; acabou o relacionamento?; “não chore, parta para outra porque a vida é curta”, os amigos nos encorajam. Sem dúvida bem intencionados, os que estão à nossa volta nos aconselham a reagir rápido, talvez até temendo também nos perder por conta da depressão que acompanha as perdas, por conta de nos afastarmos de tudo aquilo que nos lembra aquele(a) ou aquilo que se foi. E repetem “a vida é curta”.
Não sei se concordo com essa idéia de que a vida é curta. Como brasileiros somos um povo muito espiritualizados, e acreditamos na permanência no mínimo da alma, alguns do espírito que na verdade somos, após o corte com os vínculos da vida física. Quer dizer, permanecemos, numa longa vida espiritual além dessa vida terrena, para aprendermos o que precisarmos aprender, ajudar no que pudermos ajudar, crescer no que formos chamados a crescer, para nos aproximarmos, algum dia, daqui a algum tempo, da perfeição divina que precisamos buscar. Então não sei se podemos dizer que a vida é curta. Quantas vezes temos muito tempo, e um tempo que fica bastante longo, quando nos arrependemos de algo que fizemos; ou temos que sofrer dores que não esperávamos; ou perdemos um ente amado para a morte ou para outrem. Não são tempos curtos, não. A vida, definitivamente, não é curta.
Outros bem intencionados nos dizem: “ninguém é insubstituível”. Será mesmo? Todos temos peças de reposição? Aquele sorriso único, aquele humor temperado por experiências juntos, aquelas frases (que dita em outros lábios não soam da mesma maneira), a risada, o entusiasmo ou a falta dele, o jeito de olhar, a garra, e até mesmo a preguiça simpática daqueles que amamos.... tudo isso é substituível? Difícil concordar. Não, as pessoas não são substituíveis, o que não significa que não possamos esquecê-las quando preciso, ou colocar sua memória naquele lugar administrável do nosso cérebro, onde as lembranças não nos machuquem tanto mais.
Mesmo em mais mundanas esferas: a roupa rasgou, aposentamos; o sapato estragou?, deixamos de lado; o aparelho quebrou?, compramos outro. Muda a moda e nós mudamos junto, banais, temporários, esquecíveis.
Talvez possamos evoluir sem precisarmos deixar de ser relevantes, cuidadosos, atenciosos com nossos sentimentos e com os dos outros. Ser moderno, ou ser contemporâneo, não significa ser indolor, nem pisar nos nossos corações quando machucadinhos. Faz parte de nossa humanidade o pensar, considerar, aprender com o que ou quem passou; dar um tempo para reflexão, para resolver e acatar a dor; para superá-la. Não precisamos sair correndo loucamente atrás de uma vida curta para esquecer pessoas substituíveis. Talvez, vale considerar, essas experiências doídas nos ajudem a crescer, se conseguirmos, se tivermos tempo de achar a lição nela. Podemos perder algo ou alguém, mas vamos tentar não perder a lição ou a cabeça.
Sabendo que a vida é longa, e seus acontecimentos não são banais, deposito aqui todo o meu respeito pela dor de quantos experimentam perdas tão dramáticas quanto Cissa, e todo o meu respeito pela maneira com que cada um vive sua dor.
sábado, 7 de agosto de 2010
Sobre a Corrupção e o Poder
Falarei aqui sobre o caráter dos indivíduos e sobre o moralismo arraigado na cultura nacional.
Quando surge a palavra "corrupção", lembramos daqueles políticos safados que vêm a Brasília de terça a quinta-feira realizar uma encenação "pra brasileiro ver", supostamente decidindo o futuro da nação e discutindo assuntos de interesse público. Para a conveniência dos homens comuns, associamos a corrupção aos poderosos e seus círculos de relacionamento. No entanto, "corrupção" é uma palavra que partilha sua origem com "corromper". Talvez daí venha o famoso e infame ditado: "O poder corrompe".
Será?
Do alto de nosso chauvinismo e confortavelmente acomodados em nossa moralidade, reservamos a sujeira aos senhores engravatados, muitas vezes distantes de nossa realidade cotidiana, e dizemos que eles, talvez antes pessoas "de bem", seduzidos pelo poder se tornaram novos seres, de índole duvidosa e muitas vezes dispostos a barganhar qualquer coisa e utilizar toda sorte de recurso em benefício próprio. Há ainda aqueles que, para alívio de consciência, dizem que todo mundo tem um preço, o que, na prática, seria dizer "eu no lugar dos corruptos, caso fosse bem pago, faria o mesmo, e qualquer um no meu lugar faria o mesmo".
Em contra partida, na cultura pop, existe o não muito divulgado "Code of the Sith", do universo expandido de Star Wars. Escrito por Darth Bane, um Lord Sith calejado pela vida o suficiente para se tornar um sético, o Código dos Sith mostra uma visão muito mais honesta sobre a relação entre o indivíduo e o poder:
A paz é uma mentira, existe apenas a paixão.
Através da paixão, adquiro força
Através da força, adquiro poder
Através do poder, alcanço a vitória
Através da vitória, minhas correntes se partem.
A força me libertará.
Paixão (passion), no caso, não se refere à afetividade, mas à busca de um objetivo com afinco, motivação, vontade: se há paixão no indivíduo para buscar uma determinada coisa/objetivo, ele consegue a força para fazê-lo, e assim segue o raciocínio do Código. Então, vem a comparação: de acordo com o ditado, o poder corrompe; de acordo com o Código Sith, o poder liberta. Ulysses Guimarães sabiamente disse que "O poder não corrompe o homem. O homem corrompe o poder".
Então, será que o poder de fato corrompe, ou os grilhões partidos pela vitória seriam justamente a imagem pública, moldada para ocultar um caráter torpe e sem princípios?
Será que aquele colega de trabalho "gente boa" foi corrompido após a promoção e se tornou outra pessoa, ou após ser revestido por algum poder deixou para trás a imagem cuidadosamente esculpida enquanto estava um degrau abaixo? Não há a corrupção, mas a liberdade da máscara de subalterno, a evidência da verdadeira índole. Na segurança do poder, do mandar, desmandar, influenciar e decidir, o indivíduo se desprende das articulações necessárias anteriormente.
Na tendência universal de preferir culpar um mal invisível a admitir nossas próprias falhas, nós, as pessoas, nos cercamos de falsos conceitos, dizendo que não, nosso caráter não é ruim, mas as circunstâncias o modifica. Transformamos situações em males invisíveis, vilões, nos eximindo de toda e qualquer culpa. Transferimos ao imaginário a responsabilidade por nossas falhas, sujeiras, e nosso "lado negro". Lado negro, aquele, que se torna claro e ativo num primeiro momento de segurança.
Criamos muletas, escudos e esconderijos. Classificamos toda a humanidade como volúvel , para justificar uns e outros. Ao final, dizemos que somos todos feitos de uma mesma farinha rala e fraca, ignorando os exemplos gritantes de homens bons e justos que, ao contrário de outros, não corromperam o poder, nem se colocam em situação de vítima numa falta de vergonha gritante.
Os bons, os justos e os corretos nativos, e não por imposição circunstancial: por que colocá-los no saco dos que se vendem? Por que nos encolhemos e acatamos como verdades as desculpas esfarrapadas? Seria para justificar a preguiça da massa de buscar a mudança? A nossa própria preguiça?
Para finalizar, um verso de Tom York:
"When I am king you will be first against the wall"
"Quando eu for rei você será o primeiro contra a parede"
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
Me sacrifico por você! (não quero!)
"Em uma relação a gente tem sempre que se sacrificar". Essa frase é muito divulgada e bastante aceita, mas apesar de entender perfeitamente o que as pessoas, em sua maioria, querem dizer com ela, eu, realmente, não consigo concordar.
Primeiramente, quase ninguém deve levar em conta o contexto de ‘sacrifício’. Quem sacrifica, sacrifica outra coisa simbolizando a si mesmo. O sacrifício, em si, é símbolo, alegoria (excetuando Jesus, que teria SE sacrificado pela humanidade, e alguns outros casos raros, o sacrifício é sempre do ‘objeto’ representando o sujeito, e não o contrário).
Portanto, quando alguém diz que está ‘se sacrificando’ o que eu penso imediatamente é: "o que essa pessoa está sacrificando?" uma vez que não pode ser ela mesmo, mas algo que a representa.
Depois dessa primeira pergunta "sacrificando o que?", o que vem em seguida é: quanto isso vale pra ela? Se for alguma coisa superficial, não é sacrifício porque sacrifício está ligado a dor. Se for vital, a questão é: sendo vital, quanto tempo você poderá subsistir sem o elemento sacrificado?
Outro ponto interessante é que o sacrifício não é esse sinal de altruísmo todo como comumente as pessoas pensam, o sacrifício é um ato egoísta, é feito em benefício próprio! Todavia, a grande charada é que o sacrifício não é feito nem em pró de um e nem em pró do outro, mas da relação. Isso seguradamente modifica a visão da coisa e aí sim a pessoa que chama a si a responsabilidade de ser sacrificado ganha enlevo. A relação sacrifica os outros em benefício próprio, e pode haver um apagamento tão grande da pessoa sacrificada que quando a relação se for ela não será mais nada: apenas uma mancha de sangue no altar.
Acho que sacrifício é uma palavra mal empregada e obsoleta, dada a época, e a frase uma balela. Não tem que sacrificar nada. O que você é, o que tem de bom não deve ser mudado, agora excessos podem - e devem - ser retirados, mas isso não é sacríficio, é lapidação. Quando alguma coisa é identificada na relação e precisa ser mudada, não tem que ser com essa nuance de “sou mártir”. Se for algo que é essencial à sua formação, não pode ser mudado. E o que precisa ser mudado não é sacrifício, é investir na relação.
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
Nos bondes da vida
Regras de comportamento em transportes públicos:
1- Os encatarrados não devem tossir mais do que três vezes por hora, nem pigarrear mais do que quatro vezes nesse mesmo período. Além desse número, devem ir a pé ou ficar em casa;
2- O passageiro só poderá manter as pernas abertas se pagar pelos assentos ao lado;
3- Só é permitido narrar assunto íntimo se o passageiro ao lado concordar em ouvi-lo;
4- Quem fala cuspindo só deve sentar-se no banco da frente;
5- Se duas pessoas sentadas à distância quiserem conversar em voz alta, devem se limitar a não mais de 15 ou 20 palavras, tendo o cuidado de não usar palavrões ou termos maliciosos
Em 1883 essas eram algumas das sugestões bem humoradas de Machado de Assis aos usuários do transporte coletivo da época – o bonde - publicadas em uma crônica famosa chamada Como comportar-se no Bond (escrito assim mesmo, sem o “e” final). Quiséramos nós nossas preocupações atuais fossem as mesmas de Machado, nos transportes coletivos atuais ou nas ruas e escritórios, onde compartilhamos espaço com os demais habitantes do planeta.
Senão, examinemos a seguinte cena. Metrô lotado em São Paulo (ou ônibus cheio em Ribeirão Preto. A situação se aplica aos dois contextos). Temperatura “invernal” de 30 graus. A onda de calor traz, em pleno inverno, uma lembrança não saudosa do verão: as calças femininas de cintura bem baixa. Sentada no banco onde estou, meus olhos ficam no mesmo nível do útero de uma jovem, separado de mim por poucos milímetros de pele, gordura, e tecido intersticial. Se o ônibus balançar demais, meto o nariz na barriga da moça. Coisa que de maneira nenhuma me atrai.
Olho para outros bancos com esperança, mas a situação é a mesma: úteros, úteros semi-expostos, proeminentes ossos pélvicos e pubianos, restos de depilação (ou, pior ainda, de falta de depilação), encimados por barrigas mais e menos gordinhas, e umbigos quase que invariavelmente com piercing de gosto duvidoso.
Do lado de trás a situação não é melhor: cofrinhos para quem quiser, de todos os formatos, tamanhos, cores, níveis de limpeza, ladeados exuberantemente por bolas de gordura que teimam em explodir das apertadas cinturas-baixas. E os cheiros. Meu Deus os cheiros!
E não vamos nos esquecer dos menos mal, mas nem por isso de melhor gosto, os ombros descobertos pelas blusas eternamente caídas que infelizmente ainda não caíram de moda. E tome sutiã na cara, alça suja, alça dobrada, pedaços de seio e barriga - pois as blusas ainda são meio curtas de um lado. Não importa se você está num estabelecimento comercial, num banco, num órgão público municipal, estadual ou federal: sujeite-se à visão não solicitada de corpos seminus se oferecendo numa eterna sensualidade descabida, mal localizada, e de péssimo gosto.
Quando foi que todos nós concordamos em ter um grau de intimidade tão grande com estranhos? Quem está nos ditando essa humilhação? Estamos praticamente esfregando nossos órgãos nas caras das pessoas, perfeitos estranhos, sem o menor pudor e respeito primeiro para conosco mesmas, e em segundo lugar, mas não menos importante, para com o próximo que, seguramente, não pediu esse contacto de pele, pelos e gorduras.
Mas o pior - e digo como mulher - não é nem isso. Sob a triste ilusão de que estamos nos liberando, de que mostrar o corpo é sinal do progresso feminino na eterna luta entre os sexos, estamos na verdade nos desvalorizando, nos transformando em pedaços de carne em exposição constante e indigesta, a alardear que nós, brasileiras, somos mesmo nada mais que corpos, [com sorte] bonitos e desejáveis. Andem nas nossas ruas, estrangeiros, vejam como nos oferecemos ao seu paladar: nossas barrigas e traseiros, nossos púbis, nossos ombros seminus que não lhes darão o menor trabalho nem de abaixar nossas blusas. Estamos sempre prontas a seduzi-los, quer vocês queiram quer não, em plena praça pública, em plena segunda-feira, em pleno banco, nas salas de aula, no meio dos negócios, das reuniões formais, das pessoas nas ruas. Estamos sempre disponíveis, prontas para “amar”. “Comigo é na base do beijo” sacode a música, e nós já saímos rebolando nossos úteros.
Imagino como Machado de Assis se referiria a esse gradual strip-tease público patrocinado pelas moças nacionais? “As barrigas e seios das senhoras e senhoritas devem trazer-se de modo que não constranjam os passageiros do mesmo coletivo. Não se proíbem formalmente os trajes da moda, mas com a condição de que esses não ofendam os princípios de decência e não imponham aos demais passageiros a visão de orgãos íntimos, principalmente se houver senhores.”
Olavo Bilac, em 1903, bem que tentou convocar a todos (hoje sabemos, sem sucesso) para a necessidade de educação e polidez quando em situações coletivas. “Ó bonde congraçador! tu fazes mais do que nivelar os homens; tu os obriga a ser polidos, tu lhes ensinas essa tolerância e essa boa educação, que são alicerces da vida social...” (BILAC, 1996: p. 326).
Aqui estamos 107 anos depois da sugestão de Bilac, o bond já aposentado, e nós cada vez mais amontoados em hordas seminuas nos ônibus, metrôs, calçadas, escritórios e repartições públicas . Vamos lá, mulherada, vamos exercer a liberdade de nos promovermos importantes e respeitadas, sem medo de perdermos o cargo ou a atenção do amado só porque não estamos mostrando nossas intimidades em público. Afinal, mostrar “as partes” em público só vai mesmo é atrair a atenção daqueles que não nos interessam, aqueles que só querem mesmo um pedaço de carne e não vão dar a mínima aos nossos sentimentos...
1- Os encatarrados não devem tossir mais do que três vezes por hora, nem pigarrear mais do que quatro vezes nesse mesmo período. Além desse número, devem ir a pé ou ficar em casa;
2- O passageiro só poderá manter as pernas abertas se pagar pelos assentos ao lado;
3- Só é permitido narrar assunto íntimo se o passageiro ao lado concordar em ouvi-lo;
4- Quem fala cuspindo só deve sentar-se no banco da frente;
5- Se duas pessoas sentadas à distância quiserem conversar em voz alta, devem se limitar a não mais de 15 ou 20 palavras, tendo o cuidado de não usar palavrões ou termos maliciosos
Em 1883 essas eram algumas das sugestões bem humoradas de Machado de Assis aos usuários do transporte coletivo da época – o bonde - publicadas em uma crônica famosa chamada Como comportar-se no Bond (escrito assim mesmo, sem o “e” final). Quiséramos nós nossas preocupações atuais fossem as mesmas de Machado, nos transportes coletivos atuais ou nas ruas e escritórios, onde compartilhamos espaço com os demais habitantes do planeta.
Senão, examinemos a seguinte cena. Metrô lotado em São Paulo (ou ônibus cheio em Ribeirão Preto. A situação se aplica aos dois contextos). Temperatura “invernal” de 30 graus. A onda de calor traz, em pleno inverno, uma lembrança não saudosa do verão: as calças femininas de cintura bem baixa. Sentada no banco onde estou, meus olhos ficam no mesmo nível do útero de uma jovem, separado de mim por poucos milímetros de pele, gordura, e tecido intersticial. Se o ônibus balançar demais, meto o nariz na barriga da moça. Coisa que de maneira nenhuma me atrai.
Olho para outros bancos com esperança, mas a situação é a mesma: úteros, úteros semi-expostos, proeminentes ossos pélvicos e pubianos, restos de depilação (ou, pior ainda, de falta de depilação), encimados por barrigas mais e menos gordinhas, e umbigos quase que invariavelmente com piercing de gosto duvidoso.
Do lado de trás a situação não é melhor: cofrinhos para quem quiser, de todos os formatos, tamanhos, cores, níveis de limpeza, ladeados exuberantemente por bolas de gordura que teimam em explodir das apertadas cinturas-baixas. E os cheiros. Meu Deus os cheiros!
E não vamos nos esquecer dos menos mal, mas nem por isso de melhor gosto, os ombros descobertos pelas blusas eternamente caídas que infelizmente ainda não caíram de moda. E tome sutiã na cara, alça suja, alça dobrada, pedaços de seio e barriga - pois as blusas ainda são meio curtas de um lado. Não importa se você está num estabelecimento comercial, num banco, num órgão público municipal, estadual ou federal: sujeite-se à visão não solicitada de corpos seminus se oferecendo numa eterna sensualidade descabida, mal localizada, e de péssimo gosto.
Quando foi que todos nós concordamos em ter um grau de intimidade tão grande com estranhos? Quem está nos ditando essa humilhação? Estamos praticamente esfregando nossos órgãos nas caras das pessoas, perfeitos estranhos, sem o menor pudor e respeito primeiro para conosco mesmas, e em segundo lugar, mas não menos importante, para com o próximo que, seguramente, não pediu esse contacto de pele, pelos e gorduras.
Mas o pior - e digo como mulher - não é nem isso. Sob a triste ilusão de que estamos nos liberando, de que mostrar o corpo é sinal do progresso feminino na eterna luta entre os sexos, estamos na verdade nos desvalorizando, nos transformando em pedaços de carne em exposição constante e indigesta, a alardear que nós, brasileiras, somos mesmo nada mais que corpos, [com sorte] bonitos e desejáveis. Andem nas nossas ruas, estrangeiros, vejam como nos oferecemos ao seu paladar: nossas barrigas e traseiros, nossos púbis, nossos ombros seminus que não lhes darão o menor trabalho nem de abaixar nossas blusas. Estamos sempre prontas a seduzi-los, quer vocês queiram quer não, em plena praça pública, em plena segunda-feira, em pleno banco, nas salas de aula, no meio dos negócios, das reuniões formais, das pessoas nas ruas. Estamos sempre disponíveis, prontas para “amar”. “Comigo é na base do beijo” sacode a música, e nós já saímos rebolando nossos úteros.
Imagino como Machado de Assis se referiria a esse gradual strip-tease público patrocinado pelas moças nacionais? “As barrigas e seios das senhoras e senhoritas devem trazer-se de modo que não constranjam os passageiros do mesmo coletivo. Não se proíbem formalmente os trajes da moda, mas com a condição de que esses não ofendam os princípios de decência e não imponham aos demais passageiros a visão de orgãos íntimos, principalmente se houver senhores.”
Olavo Bilac, em 1903, bem que tentou convocar a todos (hoje sabemos, sem sucesso) para a necessidade de educação e polidez quando em situações coletivas. “Ó bonde congraçador! tu fazes mais do que nivelar os homens; tu os obriga a ser polidos, tu lhes ensinas essa tolerância e essa boa educação, que são alicerces da vida social...” (BILAC, 1996: p. 326).
Aqui estamos 107 anos depois da sugestão de Bilac, o bond já aposentado, e nós cada vez mais amontoados em hordas seminuas nos ônibus, metrôs, calçadas, escritórios e repartições públicas . Vamos lá, mulherada, vamos exercer a liberdade de nos promovermos importantes e respeitadas, sem medo de perdermos o cargo ou a atenção do amado só porque não estamos mostrando nossas intimidades em público. Afinal, mostrar “as partes” em público só vai mesmo é atrair a atenção daqueles que não nos interessam, aqueles que só querem mesmo um pedaço de carne e não vão dar a mínima aos nossos sentimentos...
domingo, 25 de julho de 2010
Novas mulheres
“Agora que está de mulherzinha nova, ele quase não sai!”
A frase, sem querer entreouvida no balcão dos pastéis da feira de domingo, chamou minha atenção para o par de cavalheiros em animada conversa regada a refrigerantes e – claro! – pastéis, em pé no canto do balcão improvisado. Um dos indivíduos, de costas, ostentava um bom par de bermudas azuis e um par de bons sapatos, o que me permitiu julgá-lo um profissional liberal. O outro sujeito, o autor do comentário, de frente para mim, enfeitava a recém-enunciada frase com um sorriso de connaisseur, tipo, “você sabe bem do que eu estou falando!”
Disfarçando meu interesse tentei continuar ouvindo a conversa, mas a discrição do sujeito das bermudas azuis, que com voz bem mais baixa pegou a conversa daquele ponto em diante, me impediu de saber mais do amigo da dupla, o que estava de “mulherzinha nova”. Esperando meu próprio pastel – um de palmito quase pronto prá sair da fritura em mais alguns instantes – sem querer comecei a divagar sobre o poder e o impacto da “mulherzinha nova” na vida de um homem.
Alí estava provavelmente o caso de um homem que antes da mulherzinha nova, quando ainda estava com a mulher velha, deveria sair bastante com os amigos, a turma dos confrades. Quem sabe ele até não costumava frequentar a pastelaria da feira todos os domingos para discutir a vida do grupo e de cada um, observar mulheres novas e velhas a passar com suas sacolas de verduras, legumes e frutas – e mesmo as que paravam para um pastel? Qualquer coisa menos ficar com a mulher velha. Tinham se acabado as novidades. “Preciso ir senão minha velha me xinga”, diria ele aos amigos depois de uns dois pastéis. E lá ia ele embora, cabeça baixa, antecipando a comida caseira de todos os domingos espalhando cheiro sem novidades na casa toda. Passaria a mão no cabelo, a testa meio franzida, “É... o que é que se há de fazer”. E como um condenado apreciaria o almoço com aquele temperinho já de há muito conhecido, mastigaria opiniões aqui e alí sobre assuntos que a mulher velha traria – ou quem sabe a família reunida em volta da mesa, como sempre? – e encerraria o almoço numa nota de cansaço: “Quem está jogando hoje?” E lá se ia, jogar-se no sofá, controle remoto em punho, achar o futebolzinho de domingo que ninguém é de ferro. Logo estaria roncando. A mulher velha, ajudada pelas outras mulheres velhas da família se encarregaria de tirar a mesa e arrumar a cozinha
Onde teria ele conhecido a “mulherzinha nova”? No escritório? Na rua? Apresentada pelos amigos? Talvez na feira, alí mesmo naquela pastelaria improvisada, num domingo, quando ao fim do segundo pastel, ele notou aquela bonequinha cheia de curvas e de animação. Olhares gordurosos, gulosos, foram trocados. Onde quer que tenha se iniciado, o affair todo foi um sabor novo, diferente, e tão gostoso em sua vida! Aquilo sim é que era tempero para a vida, não aquela mesmice já fatigada pela familiaridade. Devagarzinho o flerte cuidadoso virou conversa, que virou paquera, que virou namorico escondido – tão mais excitante! – e desembocou num caso muito sério. Tão sério que virou fofoca, daí virou assunto de vizinhança, e finalmente chegou aos ouvidos da principal, que não gostou nadinha do que ouviu.
Muito choro, muita mãe de santo, muita discussão de altas horas, muito briga-e-volta depois, a que perdia o posto levou o chute de misericórdia, e a nova passou a usufruir daquela mesma atenção, daquele mesmo romance que um dia cativara a que acabava de sair. Era ela quem agora enfeitava o braço do fulano, nas raras vezes em que eram vistos na rua. Estavam muito ocupados deleitando-se do recém-descoberto amor-para-sempre, construindo as memórias das quais ela iria para sempre se lembrar.
O pastel chega e me tira do devaneio. Olho a dupla de amigos agora trocando confidências em tom bem mais baixo – pena que não consigo ouví-los. Sem alternativa, pego meu pastel com cuidado – tão quente! - e saio andando pela feira ainda tentando imaginar a boazudice da “mulherzinha nova”. À minha volta, na feira, mulheres novas, velhas, acompanhadas, desacompanhadas, passavam seu domingo de manhã talvez pensando nos cardápios que sairiam de suas sacolas. Quantas delas eram também “mulherzinhas novas” na vida de seus homens? Quantas teriam sido, um dia? Quantas quiçá ainda se deleitavam da atenção completa de um homem que as acabara de descobrir como o grande amor de suas vidas? Quantas – entre as desacompanhadas – seriam a mulher velha de alguém, aquela que já não serve, passada prá trás, substituída por uma encantadora nova aquisição? Quantas – mesmo que velhas – seriam ainda mimadas e amadas por um bom homem, que ainda veria nelas o encanto dos primeiros dias? Ou será que não existe isso, quer dizer, mulher acaba sempre ficando velha para o seu homem?
O recheio gostoso do pastel, os cheiros, as cores e os sons da feira eram otimistas por natureza, e resolvi acreditar que tudo era possível para as demais mulheres à minha volta: o ruim e o bom, o novo e o velho, a alegria do novo romance e o recuperar-se do velho romance, e também o encontrar-se o novo, no outro ou em si mesmo, sempre. O ritmo da feira, previsível, sempre lá, mas também sempre trazendo o novo, o recém colhido e achado das hortas e pomares, uma tradição brasileira, que tem também o ritmo das possibilidades sempre renovadas.
Possibilidades renovadas para aquele desconhecido da dupla de fregueses da pastelaria. E possibilidades renovadas para os universos de mulheres velhas e novas que gostariam muito de ter rédeas mais seguras de seu destino amoroso, mas que continuam valentes, laboriosas, relevantes, e renovadas, apesar de tudo.
A frase, sem querer entreouvida no balcão dos pastéis da feira de domingo, chamou minha atenção para o par de cavalheiros em animada conversa regada a refrigerantes e – claro! – pastéis, em pé no canto do balcão improvisado. Um dos indivíduos, de costas, ostentava um bom par de bermudas azuis e um par de bons sapatos, o que me permitiu julgá-lo um profissional liberal. O outro sujeito, o autor do comentário, de frente para mim, enfeitava a recém-enunciada frase com um sorriso de connaisseur, tipo, “você sabe bem do que eu estou falando!”
Disfarçando meu interesse tentei continuar ouvindo a conversa, mas a discrição do sujeito das bermudas azuis, que com voz bem mais baixa pegou a conversa daquele ponto em diante, me impediu de saber mais do amigo da dupla, o que estava de “mulherzinha nova”. Esperando meu próprio pastel – um de palmito quase pronto prá sair da fritura em mais alguns instantes – sem querer comecei a divagar sobre o poder e o impacto da “mulherzinha nova” na vida de um homem.
Alí estava provavelmente o caso de um homem que antes da mulherzinha nova, quando ainda estava com a mulher velha, deveria sair bastante com os amigos, a turma dos confrades. Quem sabe ele até não costumava frequentar a pastelaria da feira todos os domingos para discutir a vida do grupo e de cada um, observar mulheres novas e velhas a passar com suas sacolas de verduras, legumes e frutas – e mesmo as que paravam para um pastel? Qualquer coisa menos ficar com a mulher velha. Tinham se acabado as novidades. “Preciso ir senão minha velha me xinga”, diria ele aos amigos depois de uns dois pastéis. E lá ia ele embora, cabeça baixa, antecipando a comida caseira de todos os domingos espalhando cheiro sem novidades na casa toda. Passaria a mão no cabelo, a testa meio franzida, “É... o que é que se há de fazer”. E como um condenado apreciaria o almoço com aquele temperinho já de há muito conhecido, mastigaria opiniões aqui e alí sobre assuntos que a mulher velha traria – ou quem sabe a família reunida em volta da mesa, como sempre? – e encerraria o almoço numa nota de cansaço: “Quem está jogando hoje?” E lá se ia, jogar-se no sofá, controle remoto em punho, achar o futebolzinho de domingo que ninguém é de ferro. Logo estaria roncando. A mulher velha, ajudada pelas outras mulheres velhas da família se encarregaria de tirar a mesa e arrumar a cozinha
Onde teria ele conhecido a “mulherzinha nova”? No escritório? Na rua? Apresentada pelos amigos? Talvez na feira, alí mesmo naquela pastelaria improvisada, num domingo, quando ao fim do segundo pastel, ele notou aquela bonequinha cheia de curvas e de animação. Olhares gordurosos, gulosos, foram trocados. Onde quer que tenha se iniciado, o affair todo foi um sabor novo, diferente, e tão gostoso em sua vida! Aquilo sim é que era tempero para a vida, não aquela mesmice já fatigada pela familiaridade. Devagarzinho o flerte cuidadoso virou conversa, que virou paquera, que virou namorico escondido – tão mais excitante! – e desembocou num caso muito sério. Tão sério que virou fofoca, daí virou assunto de vizinhança, e finalmente chegou aos ouvidos da principal, que não gostou nadinha do que ouviu.
Muito choro, muita mãe de santo, muita discussão de altas horas, muito briga-e-volta depois, a que perdia o posto levou o chute de misericórdia, e a nova passou a usufruir daquela mesma atenção, daquele mesmo romance que um dia cativara a que acabava de sair. Era ela quem agora enfeitava o braço do fulano, nas raras vezes em que eram vistos na rua. Estavam muito ocupados deleitando-se do recém-descoberto amor-para-sempre, construindo as memórias das quais ela iria para sempre se lembrar.
O pastel chega e me tira do devaneio. Olho a dupla de amigos agora trocando confidências em tom bem mais baixo – pena que não consigo ouví-los. Sem alternativa, pego meu pastel com cuidado – tão quente! - e saio andando pela feira ainda tentando imaginar a boazudice da “mulherzinha nova”. À minha volta, na feira, mulheres novas, velhas, acompanhadas, desacompanhadas, passavam seu domingo de manhã talvez pensando nos cardápios que sairiam de suas sacolas. Quantas delas eram também “mulherzinhas novas” na vida de seus homens? Quantas teriam sido, um dia? Quantas quiçá ainda se deleitavam da atenção completa de um homem que as acabara de descobrir como o grande amor de suas vidas? Quantas – entre as desacompanhadas – seriam a mulher velha de alguém, aquela que já não serve, passada prá trás, substituída por uma encantadora nova aquisição? Quantas – mesmo que velhas – seriam ainda mimadas e amadas por um bom homem, que ainda veria nelas o encanto dos primeiros dias? Ou será que não existe isso, quer dizer, mulher acaba sempre ficando velha para o seu homem?
O recheio gostoso do pastel, os cheiros, as cores e os sons da feira eram otimistas por natureza, e resolvi acreditar que tudo era possível para as demais mulheres à minha volta: o ruim e o bom, o novo e o velho, a alegria do novo romance e o recuperar-se do velho romance, e também o encontrar-se o novo, no outro ou em si mesmo, sempre. O ritmo da feira, previsível, sempre lá, mas também sempre trazendo o novo, o recém colhido e achado das hortas e pomares, uma tradição brasileira, que tem também o ritmo das possibilidades sempre renovadas.
Possibilidades renovadas para aquele desconhecido da dupla de fregueses da pastelaria. E possibilidades renovadas para os universos de mulheres velhas e novas que gostariam muito de ter rédeas mais seguras de seu destino amoroso, mas que continuam valentes, laboriosas, relevantes, e renovadas, apesar de tudo.
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