domingo, 15 de agosto de 2010

Ideologia: escolha uma prá viver

Em 1988 Cazuza gritava - e o Brasil junto com ele - querer uma ideologia prá viver. Cansados de ditadura, de segredos, de desmandos, de desconfianças, queríamos confiar e seguir, puramente, uma ideologia, pois estávamos sem nenhuma. A Redentora, como a revolução de 1964 se auto-proclamou em sua proverbial arrancada, não nos forneceu uma, que muitos de nós queríamos e até precisávamos. Vínhamos afinal de um período de muita corrupção, abuso do dinheiro público, falta de confiança nos governantes (alguma similaridade com o que vivemos agora?). Olhar os jornais da época imediatamente antes do fatídico março de 1964 é como olhar os jornais de hoje. Recomendo a pesquisa para quem quiser se aprofundar.
Aliás, essa seria uma boa pesquisa para limpar um pouco o nosso passado tantas vezes tão desinformado. Não estou defendendo que ditadura é bom. Mas estávamos demais sem rumo, sendo abusados (da mesma maneira como estamos sendo abusados agora) por políticos demais de corruptos. A única diferença com agora é que as forças armadas eram mais fortes e resolveram tomar a si a tarefa de moralizar o país. Era esse o intuito - pelo menos o divulgado - no início da Revolução. Que atire a primeira pedra quem nunca pensou se não haveria um poder maior para acabar com essa baderna política, moral, ética (e que mais?) generalizada que está o Brasil! Naquele ano de 1964, esse poder maior foi o militar. O problema, infelizmente, é que o poder seduz demais, e depois nem eles querem mais sair, nem continuam tão santinhos. E o povo volta a ser - continua sendo - abusado!
Tudo isso para abrir o assunto da ideologia. A que quero falar é aquela que vem disfarçada em boas - ótimas! - idéias, soluções das quais precisamos e as quais abraçamos com entusiasmo e (tantas vezes) com ingenuidade, apenas para depois percebermos que atrás delas tinha uma ideologia da qual não havíamos sido informados. Todo um grupo de pessoas com suas bíblias/seus códigos, reunindo-se em cúpula sem os cordeirinhos seguidores, decidindo os rumos do grupo entre eles, e fingindo que a gente faz parte das decisões.
Será que o distinto(a) e generoso(a) leitor(a) desse blog já se viu em uma situação dessas, em que é convidado para algo que parece ótimo, e ao chegar, com o passar da conversa ou do tempo, percebe que há ou uma igreja por trás de tudo, ou um grupo filosófico, ou um partido político, ou uma seita, enfim, algo que não aparecia do lado de fora....?? É a essa que me refiro.
Pois não nos enganemos: esses golpes são tão ruins quanto a ditadura foi, senão piores, porque a ditadura pelo menos a gente sabia que era o que era. Afinal, os movimentos, políticos, grupos, seitas e religiões que se escondem atrás de máscaras santimônias estão nos enganando, estão querendo mostrar um poder de multidão que na verdade não têm, e usando de nossa boa fé para isso. Sendo o brasileiro um povo dócil e que não gosta de confrontar, muitas vezes acabamos lá, como ovelhas no abate, adicionando número e emprestando ouvidos a discursos que não queremos ouvir, tentando nos adaptar a ideologias das quais não gostamos, sendo mentalmente e emocionalmente estuprados, desviados daquilo que realmente gostaríamos de estar fazendo - o que quer seja aquilo que queremos.
Ser livre não é isso, ser bom não é isso, e ser gentil não é isso. Sem aprofundamento filosófico, e numa definição bem geral, ser livre é poder ser o que se é abertamente, sem nenhuma censura (seja de olhares virados, brincadeiras, cutucações, ironias, ou cochichos), ser bom é agir com ética e fazer sempre o melhor que pudermos, e ser gentil é respeitar o outro e a nós mesmos mantendo a dignidade e a integridade de todos.
Estou mencionando isso porque acabei de viver (de novo) tal aventura - em plenos 2010 e após algumas décadas de vida - o que me diz que os oportunistas da captação cerebral não descansam - nem cansam - nunca!
Então vamos prestar atenção, pessoal da tribo das pessoas boas, e não vamos esquecer que, especialmente nesse ano político, e se é verdade que somos agora livres, podemos respeitosamente levantar e sair dessas armadilhas e nos dedicarmos a sermos nós mesmos.

2 comentários:

  1. Bem colocado!

    Eu fico pensando nas "máximas" que as pessoas inventam para justificar a permissividade.

    O grito pela ideologia, assim como tantos outros gritos, via de regra são da boca para fora.

    Cultivar valores, ideais, é uma atividade que demanda tempo, dedicação, e muitas vezes o sacrifício de privilégios que via "jeitinho brasileiro" são facilmente conquistados.

    Sofremos de uma "preguiça moral" de difícil correção.

    Infelizmente.

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  2. Ana,

    Pra mim a nossa democracia é a mesma que o 'livre arbítrio'. É o mesmo poder de escolha que uma marido dá a uma esposa quando diz: você pode me deixar, mas passando por aquela porta eu te dou um tiro na cara.

    Quero dizer, a gente até pode ir lá apertar as teclinhas, mas a verdade é que não temos escolhas, as ideologias vêm sendo mascaradas e a questão é que não existe mais esquerda ou direita, existe um grande centrão que vai para lá ou para cá dependendo do interesse.

    Pra mim, a única saida é ser, senão ideológicos, pelo menos dialógicos, porque a coisa está feia e a gente com um sorriso na cara.

    =/

    beijo

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